RESSURREIÇÃO
Pe. Eliseu Oliveira
A
fé é a experiência do encontro com uma Pessoa divina que nos ama e dá sentido à
todos os aspectos da nossa vida. É o encontro com o Filho amado, que nos revela
o Pai, o amante, no horizonte do Espírito, o puro amor.
Mas
no caminho e no centro deste encontro está um grito de dor, de desespero e de
abandono: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mc, 15,35; Mt 27,46)
Está também a revelação da misericórdia e do perdão de um Deus que conhece a
nossa fraqueza: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que estão fazendo!”(Lc
23,34). Antes da alegria da ressurreição, está a história da morte de quem
entregou tudo, por amor. “Então Jesus deu um forte grito, e entregou o espírito”
(Mt 27,50; Jo, 19,30; Cf. Lc 23,46).
Todos
esses acontecimentos salvíficos fazem parte do evento traumático da cruz, que
escandalizou o próprio Filho de Deus. No meio de sua angústia ele reza: “Meu
Pai, se é possível, afasta-se de mim este cálice. Contudo, não seja feito como eu
quero, e sim como tu queres” (Mt 26,19; cf. Mc 14,36, Lc 22,41). A cruz também
infligiu um duro golpe na esperança dos discípulos, gerando-lhes uma crise de
fé. Os discípulos de Emaús expressam essa decepção com as seguintes palavras:
“Nossos chefes dos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à
morte, e o crucificaram. Nós esperávamos que fosse ele o libertador de Israel,
mas, apesar de tudo isso, já faz três dias que tudo isso aconteceu!” (Lc
24,21).
Depois da ressurreição e da ascensão, os
discípulos, tomados de euforia, tiveram a tentação de esquecer o evento da
cruz, como aqueles que maquiam a realidade e escondem os momentos de sofrimento
para viver um mundo em que só existe alegria e bem-estar. Por isso, na primeira
carta aos Coríntios, o apóstolo Paulo diz: “Entre vós, eu não quis saber outra
coisa a não ser Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado” (1Cor 2, 2), pois no
capítulo anterior ele explica que “a linguagem da cruz é loucura para aqueles
que se perdem. Mas para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus” (1Cor
1,18).
O
sacerdócio de Cristo realizado na cruz é evento eficaz de salvação (Hb 8-10) e
exemplo de humildade para todo cristão. São Paulo aos Filipenses, diz: “Tenham
em vocês os mesmos sentimentos que
haviam em Cristo Jesus: Ele tinha a condição divina, mas não se apegou a
sua igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo, assumindo a
condição de servo e tornando-se semelhante aos homens. Assim, apresentando-se
como simples homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte,
e morte de cruz!” (Fl 2,5-8).
O
Ressuscitado é o Crucificado e o Crucificado é o Ressuscitado. Não há,
portanto, uma ruptura entre a mensagem do Jesus histórico e o Cristo da fé
anunciado pelas primeiras comunidades. A ressurreição comprova que o Pai não
abandona o Filho na morte, mas o resgata (At 2,32), na força do Espírito
vivificador (Rm 8,11), confirmando a mensagem do Cristo, morto pela maldade do
coração humano, de forma injusta e humilhante, e é também esperança para todos
os injustiçados, humilhados, àqueles que, para o mundo, nada são: os muitos
‘crucificados da história’. Como refletiu São Paulo: “Mas o que para o mundo é
loucura, Deus o escolheu para envergonhar o que é forte. Deus escolheu o que no
mundo não tem nome nem prestígio, aquilo que é nada, para assim mostrar a nulidade
dos que são alguma coisa” (1Cor 1,27-28).
Celebrando
a páscoa, não celebramos apenas a Ressurreição, a vitória da Vida sobre a
Morte, mas o evento pascal como um todo, a morte-ressurreição-ascensão-vinda do
Espírito Santo. A Ressurreição inaugura o tempo da Nova Criação, antecipação da
Vida Eterna, onde estaremos em Comunhão com a Santíssima Trindade, motivo
primeiro de Deus ter criado tudo o que existe; reconduzindo a criação ao seu
eterno sábado, o sétimo dia da obra divina, depois de ter visto que “tudo era
muito bom” (Gn 1,31).
A
Igreja é o prolongamento da ação de Cristo-Ressuscitado, pois ela mesma é o seu
corpo místico (Cf. Col 1,18; LG 7). O batismo nos incorpora a esse Cristo,
quando somos assimilados em sua morte e ressurreição (Rm 6,4). Fazemos parte do
povo de Deus, vivendo o amor fraterno, a caridade, a misericórdia, celebrando o
mistério pascal, fazendo crescer a graça recebida nos sacramentos, peregrinamos para a vida eterna, pois “a
Igreja, à qual todos somos chamados e na qual por graça de Deus alcançamos a
santidade, só na glória celeste alcançará a sua realização acabada, quando vier
o tempo da restauração de todas as coisas (cfr. At. 3,21) e, quando, juntamente
com o gênero humano, também o universo inteiro, que ao homem está intimamente
ligado e por ele atinge o seu fim, for perfeitamente restaurado em Cristo (cfr.
Ef, 1,10; Col. 1,20; 2 Ped. 3, 10-13)” (LG 48).
No comments:
Post a Comment